domingo, 31 de agosto de 2014

STJ - Impenhorabilidade aplicação financeira - Reserva única de até 40 mínimos é impenhorável, qualquer que seja a aplicação financeira


Reserva única de até 40 mínimos é impenhorável, qualquer que seja a aplicação financeira.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que é impenhorável o valor correspondente a 40 salários mínimos da única aplicação financeira em nome da pessoa, mesmo que esteja depositado por longo período de tempo.
A garantia não se restringe às cadernetas de poupança, mas vale para qualquer tipo de aplicação financeira.
O entendimento foi proferido no julgamento de um recurso especial afetado pela Quarta Turma à Segunda Seção. O recorrente contestava acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) que afirmou que seu créditotrabalhista aplicado em fundo DI não possuía caráter salarial e alimentar, por isso poderia ser penhorado.
O tribunal paranaense afirmou que a impenhorabilidade das verbas até 40 salários mínimos somente seria aplicável às quantias depositadas em cadernetas de poupança, não atingindo valores depositados em fundos de investimento ou outras aplicações financeiras.
Depositado em fundo de investimento, o crédito oriundo de reclamação trabalhista do recorrente não foi utilizado por mais de dois anos, compondo reserva de capital. Segundo o TJPR, em virtude da não utilização da verba para a satisfação de necessidades básicas, ela perdeu o caráter salarial e alimentar e ficou sujeita à penhora.
Jurisprudência
A ministra Isabel Gallotti, relatora do recurso no STJ, citou precedente da Quarta Turma (REsp 978.689), segundo o qual “é inadmissível a penhora dos valores recebidos a título de verba rescisória de contrato de trabalho e depositados em conta corrente destinada ao recebimento de remuneração salarial (conta salário), ainda que tais verbas estejam aplicadas em fundos de investimentos, no próprio banco, para melhor aproveitamento do depósito”.
A ministra afirmou, todavia, que concorda com o entendimento da Terceira Turma no REsp 1.330.567 sobre a penhorabilidade, em princípio, das sobras salariais após o recebimento do salário ou vencimento seguinte.
Para Gallotti, as sobras salariais “após o recebimento do salário do período seguinte, quer permaneçam na conta corrente destinada ao recebimento da remuneração, quer sejam investidas em caderneta de poupança ou outro tipo de aplicação financeira, não mais desfrutam da natureza de impenhorabilidade decorrente do inciso IV do artigo 649 do Código de Processo Civil (CPC).
Entretanto, a ministra explicou que as verbas obtidas após a solução de processos na Justiça do Trabalho “constituem poupança forçada de parcelas salariais das quais o empregado se viu privado em seu dia a dia por ato ilícito do empregador. Despesas necessárias, como as relacionadas à saúde, podem ter sido adiadas, arcadas por familiares ou pagas à custa de endividamento”.
Gallotti também considerou que o valor recebido como indenização trabalhista e não utilizado, após longo período depositado em fundo de investimento, “perdeu a característica de verba salarial impenhorável”, conforme estabelece o inciso IV do artigo 649 do CPC.
Reserva única
Todavia, segundo a relatora, é impenhorável a quantia de até 40 salários mínimos poupada, “seja ela mantida em papel moeda, conta corrente ou aplicada em caderneta de poupança propriamente dita, CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que seja a única reserva monetária em nome do recorrente, e ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude, a ser verificado caso a caso”. A ministra afirmou que esse deve ser o entendimento a respeito do inciso X do artigo 649 do CPC.
Segundo ela, o objetivo do dispositivo “não é estimular a aquisição de reservas em caderneta de poupança em detrimento do pagamento de dívidas, mas proteger devedores de execuções que comprometam o mínimo necessário para a sua subsistência e a de sua família, finalidade para a qual não tem influência alguma que a reserva esteja acumulada em papel moeda, conta corrente, caderneta de poupança propriamente dita ou outro tipo de aplicação financeira, com ou sem garantia do Fundo Garantidor de Créditos (FGC)”.
De acordo com a Segunda Seção, a verba de até 40 salários mínimos – mesmo que tenha deixado de ser impenhorável com base no inciso IV do artigo 649, em virtude do longo período de depósito em alguma aplicação – mantém a impenhorabilidade pela interpretação extensiva do inciso X, se for a única reserva financeira existente, pois poderá ser utilizada para manter a família.

Fonte STJ – 27.08.2014 – REsp 1230060

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

STF: Ação judicial sobre concessão de benefício deve ser precedida de requerimento ao INSS

O Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão plenária nesta quarta-feira (27), deu parcial provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 631240, com repercussão geral reconhecida, em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) defendia a exigência de prévio requerimento administrativo antes de o segurado recorrer à Justiça para a concessão de benefício previdenciário. Por maioria de votos, o Plenário acompanhou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, no entendimento de que a exigência não fere a garantia de livre acesso ao Judiciário, previsto no artigo , incisoXXXV, da Constituição Federal, pois sem pedido administrativo anterior, não fica caracterizada lesão ou ameaça de direito.
Em seu voto, o ministro Barroso considerou não haver interesse de agir do segurado que não tenha inicialmente protocolado seu requerimento junto ao INSS, pois a obtenção de um benefício depende de uma postulação ativa. Segundo ele, nos casos em que o pedido for negado, total ou parcialmente, ou em que não houver resposta no prazo legal de 45 dias, fica caracterizada ameaça a direito.
Não há como caracterizar lesão ou ameaça de direito sem que tenha havido um prévio requerimento do segurado. O INSS não tem o dever de conceder o benefício de ofício. Para que a parte possa alegar que seu direito foi desrespeitado é preciso que o segurado vá ao INSS e apresente seu pedido, afirmou o ministro.
O relator observou que prévio requerimento administrativo não significa o exaurimento de todas as instâncias administrativas. Negado o benefício, não há impedimento ao segurado para que ingresse no Judiciário antes que eventual recurso seja examinado pela autarquia. Contudo, ressaltou não haver necessidade de formulação de pedido administrativo prévio para que o segurado ingresse judicialmente com pedidos de revisão de benefícios, a não ser nos casos em que seja necessária a apreciação de matéria de fato. Acrescentou ainda que a exigência de requerimento prévio também não se aplica nos casos em que a posição do INSS seja notoriamente contrária ao direito postulado.
No caso concreto, uma trabalhadora ingressou na Justiça pedindo a concessão de aposentadoria rural por invalidez alegando preencher os requisitos legais exigidos para se obter a concessão do benefício. O processo foi extinto, sem exame do mérito, porque o juiz entendeu que havia necessidade de requerimento inicial junto ao INSS. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) reformou a decisão, o que motivou a interposição do recurso extraordinário pelo INSS.
Ficaram vencidos o ministro Marco Aurélio, que abriu a divergência, e a ministra Cármem Lúcia, que entenderam que a exigência de prévio requerimento junto ao INSS para o ajuizamento de ação representa restrição à garantia de acesso universal à Justiça.
Na tribuna, representante da Procuradoria-Geral Federal apresentou sustentação em nome do INSS e argumentou haver ofensa aos artigos  e , inciso XXXV, daConstituição Federal, porque no caso teria sido garantido o acesso ao Judiciário, independentemente de ter sido demonstrado o indeferimento da pretensão no âmbito administrativo. Representantes da Defensoria Pública Geral da União e do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), admitidos no processo como amici curiae, bem como o advogado da recorrida manifestaram-se pelo desprovimento do recurso e enfatizaram, entre outros pontos, que as dificuldades de acesso ao INSS para uma parcela dos trabalhadores, especialmente os rurais, tornam desnecessário o prévio requerimento administrativo do benefício para o ajuizamento de ação previdenciária.
Propostas
Na sessão desta quinta-feira (28), o Plenário discutirá uma proposta de transição para os processos que estão sobrestadas, pelo menos 8.600 segundo as informações enviadas pelas instâncias inferiores, em decorrência do reconhecimento da repercussão geral. O ministro Barroso considera importante formular uma proposta que resguarde o momento de ingresso em juízo como o marco de início do benefício, nos casos em que houver o direito, e desobrigue o segurado de propor nova ação se seu direito não for reconhecido pelo INSS.
Segundo a proposta apresentada pelo relator para discussão em Plenário, a parte autora da ação deverá ser intimada para dar entrada em pedido administrativo junto ao INSS em 30 dias e a autarquia, por sua vez, deverá ter 90 dias para se pronunciar.
PR/AD

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

TJSP - Padrastro indenizará enteado por discriminação sexual

A 9ª Câmara de Direito Privado do TJSP determinou que um enteado seja indenizado pelo padrasto por conta do tratamento discriminatório que sofreu, devido a sua orientação sexual, em Avaré. A reparação por danos morais foi arbitrada em R$ 10 mil.
         O autor relatou que passou a sofrer discriminação desde que revelou sua homossexualidade à família. O padrasto proferia xingamentos e ofensas em casa e também em público, causando-lhe constrangimentos diários.
         De acordo com o relator Walter Piva Rodrigues, as provas reunidas nos autos apontaram que o réu criou um clima hostil ao enteado unicamente em razão de sua opção sexual. O desembargador ainda apontou comando constitucional (art. 227) segundo o qual é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar ao jovem proteção contra a discriminação.
         “Não bastasse o preconceito social que o autor enfrenta por conta de sua orientação, teve de passar por verdadeiro suplício dentro de sua casa, seio de sua família, por conta da conduta do réu. Os xingamentos noticiados, bem como o constante desrespeito pela individualidade do autor, certamente são o bastante para configurar o dano moral.”
         O recurso foi decidido de forma unânime pela turma julgadora, composta também pelos desembargadores Galdino Toledo Júnior e Mauro Conti Machado.

Comunicação Social TJSP – BN (texto) - imprensatj@tjsp.jus.br



sexta-feira, 15 de agosto de 2014

STJ - Segunda Seção reafirma direito a reposição de expurgo para poupadores do BB em todo o país

A sentença que condenou o Banco do Brasil a pagar diferenças decorrentes de expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança ocorridos em janeiro de 1989 (Plano Verão) tem abrangência nacional e independe de os poupadores fazerem parte dos quadros associativos do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), que ajuizou a ação civil pública.

Esse foi o entendimento firmado pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em julgamento de recurso especial sob o rito dos repetitivos (artigo 543-C do Código de Processo Civil).

No recurso tomado como representativo da controvérsia, o Banco do Brasil alegou que, como a ação foi julgada pelo juízo da 12ª Vara Cível de Brasília, a sentença teria validade limitada às contas de poupança abertas no Distrito Federal, beneficiando apenas os consumidores com domicílio na jurisdição do órgão prolator da sentença.

Outro argumento apresentado pelo banco foi que somente os poupadores associados ao Idec teriam legitimidade ativa para buscar o cumprimento da sentença.

Coisa julgada

O relator, ministro Luis Felipe Salomão, negou provimento ao recurso do BB e foi acompanhado de forma unânime pela Seção.

Segundo ele, no julgamento da ação coletiva ficou definido que a decisão deveria contemplar todos os poupadores que mantinham conta no BB em janeiro de 1989, e não apenas os que residiam no Distrito Federal e eram vinculados ao Idec, e que esse entendimento foi mantido até mesmo pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Por isso, destacou Salomão, não cabe reexaminar o que foi decidido naquele momento, em respeito ao princípio da coisa julgada e à autoridade do STF: “É nítido, da leitura das decisões que formam o título executivo, que os limites objetivos e subjetivos da decisão já foram estabelecidos, no mais amplo contraditório.”

Ele observou que o Banco do Brasil recorreu na ação civil pública tanto para o STJ quanto para o STF, que rejeitou seu recurso, e que durante o processo a instituição financeira levantou as mesmas teses do recurso especial em julgamento, embora o instituto da coisa julgada impeça o Judiciário de reapreciá-las.

De acordo com o ministro, o alcance estabelecido para a decisão na ação civil pública só poderia ser alterado mediante processo autônomo de impugnação – por exemplo, uma ação rescisória, da qual teria de participar o Idec – ou na hipótese em que o STF, ao julgar a questão dos expurgos, decidisse estender o efeito de seu pronunciamento para os casos já transitados em julgado.

Local da execução

Salomão também reconheceu ao beneficiário da sentença coletiva – poupador ou seu espólio – o direito de ajuizar a execução individual em seu domicílio. “Embora o pedido seja certo, a sentença, em regra, será genérica, de modo a permitir a cada vítima lesada demonstrar e quantificar o dano experimentado (artigo 81, parágrafo único, II, e artigo 91 do Código de Defesa do Consumidor)”, explicou.

A decisão vai orientar as demais instâncias da Justiça sobre como proceder em casos idênticos. Segundo Salomão, apenas de sua relatoria já foram mais de 200 decisões envolvendo a mesma controvérsia e, na Terceira e na Quarta Turmas, além da Segunda Seção, já há mais de 570 decisões no mesmo sentido.

“Há notícia dos tribunais no sentido de que já são mais de cinco mil recursos parados, aguardando este julgamento, todos decorrentes da mesma ação civil pública”, informou o ministro.

“A questão está pacificada nesta corte, com inúmeros julgados no mesmo sentido, não havendo nenhuma posição contrária entre os integrantes da Seção”, concluiu o relator.

O Banco do Brasil havia pedido a suspensão do trâmite do recurso, pois a controvérsia sobre a reposição dos expurgos dos planos econômicos aguarda pronunciamento do STF, onde já foi reconhecida a repercussão geral do tema. No entanto, Salomão negou o pedido por entender que a questão discutida no recurso especial repetitivo não diz respeito à matéria de fundo que será julgada pelo STF, mas sim à execução individual de sentença coletiva já transitada em julgado.

Esta notícia se refere ao processo: REsp 1391198

sábado, 9 de agosto de 2014

CREMESP - Prontuário médico

Acompanhe recomendação do CFM no que diz respeito ao fornecimento do documento de paciente em óbito


Aos Médicos, Diretores Clínicos, Diretores Técnicos e Presidentes de Comissões de Ética Médica do Estado de São Paulo

RECOMENDAÇÃO    
Prontuário médico de paciente falecido
 Recomendação CFM nº 3/14
EMENTA: Recomendar aos profissionais médicos e instituições de tratamento médico, clínico, ambulatorial ou hospitalar no sentido de:

a) fornecerem, quando solicitados pelo conjuge;companheiro sobrevivente do paciente morto, e sucessivamente pelos sucessores legítimos do paciente em linha reta, ou colaterais até o quarto grau, os prontuários médicos do paciente falecido: desde que documentalmente comprovado o vínculo familiar e observada a ordem de vocação hereditária;

b) informarem aos pacientes acerca da necessidade de manifestação expressa da objeção à divulgação do seu prontuário médico após sua morte.
 

São Paulo, 05 de agosto de 2014
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

STJ: Seguro de saúde. Pessoa enferma. Não se pode equiparar a um seguro patrimonial. Limite monetário de cobertura. Não há como se estabelecer uma regra ou um padrão

"Outrossim, cumpre destacar que o bem aqui segurado é a saúde humana, o que se mostra incompatível com a fixação de um valor monetário determinado, como acontece com o seguro de automóveis e outros bens materiais. Não há como mensurar previamente o montante máximo a ser despendido com a recuperação da saúde de uma pessoa enferma, como se faz, por exemplo, facilmente até, com o conserto de um carro. Não há como se estabelecer uma regra, um valor padrão, para tratamento do indivíduo enfermo, sobretudo porque existem vários fatores exógenos e endógenos que podem influenciar no tempo de internação, na necessidade de encaminhamento à unidade de terapia intensiva - UTI -, no tipo de procedimento adotado, na cirurgia escolhida, e, inevitavelmente, no valor de custeio do tratamento. Caso se considerasse não abusiva a referida cláusula, ter-se-ia a seguinte situação: um paciente segurado teria seu tratamento interrompido antes de alcançar a cura da enfermidade, tão logo atingido o tal limite máximo de valor autorizado no contrato de seguro-saúde, o qual, evidentemente, se tornaria de todo inútil. Com efeito, não se pode equiparar o seguro-saúde a um seguro patrimonial, no qual é possível e fácil aferir o valor do bem segurado, criando limites de reembolso/indenização. Afinal, quem segura a saúde de outrem está garantindo o custeio de tratamento de doenças que, por sua própria natureza, são imprevisíveis, inclusive quanto aos gastos a serem despendidos com os custos hospitalares. Tem-se, assim, que não pode haver limite monetário de cobertura para as despesas hospitalares, sob pena de se esvaziar o direito do segurado e o próprio objeto da contratação, que é, por natureza, de custos imprevisíveis, sendo essa, inclusive, uma das razões que leva a pessoa a contratar seguro de saúde. É certamente por isso que a Lei 9.656⁄98 - que estabelece as regras dos planos privados de assistência à saúde -, vigente à época dos fatos, prevê, em seu art. 12, II, a e b, que, na cobertura de internações hospitalares simples e em centro de terapia intensiva, ou similar, fica "vedada a limitação de prazo, valor máximo e quantidade". Também o Decreto-Lei 73⁄66 - que regula o Sistema Nacional de Seguros Privados -, em seu art. 13, dispõe que "as apólices não poderão conter cláusula que permita rescisão unilateral dos contratos de seguro ou por qualquer modo subtraia sua eficácia e validade além das situações previstas em Lei". Portanto, seja por violação às normas do Código de Defesa do Consumidor (arts. 4º, 6º, 51) ou ao disposto na Lei 9.656⁄98 e no Decreto-Lei 73⁄66, deve ser considerada abusiva a cláusula do contrato de seguro-saúde que crie limitação de valor para o custeio de tratamento de saúde ou de internação hospitalar de segurado ou beneficiário".

http://www.cc2002.com.br/noticia.php?id=6262

Saúde: SUS - Governo gasta em média R$ 3,05 por dia na saúde de cada habitante, aponta levantamento do CFM


Um levantamento do Conselho Federal de Medicina avaliou o gasto per capita em saúde pública no país, mostrando que os valores aplicados são insuficientes para atender necessidades da população. Um gasto de R$ 3,05 ao dia em saúde. Este é o valor que os governos federal, estaduais e municipais aplicaram em 2013 para cobrir as despesas dos mais de 200 milhões de brasileiros usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Ao todo, o gasto per capita em saúde naquele ano foi de R$ 1.098,75. O valor, segundo análise do Conselho Federal de Medicina (CFM), está abaixo dos parâmetros internacionais e representa apenas metade do que gastaram os beneficiários de planos de saúde do Brasil no mesmo período.

As informações levantadas pelo CFM consideraram as despesas apresentadas pelos gestores à Secretaria do Tesouro Nacional, do Ministério da Fazenda, por meio de relatórios resumidos de execução orçamentária. Em 2013, as despesas nos três níveis de gestão atingiram a cifra de R$ 220,9 bilhões. O montante agrega todas as despesas na chamada “função saúde”, destinada à cobertura das ações de aperfeiçoamento do sistema público de saúde. Boa parte desse dinheiro é usada também para o pagamento de funcionários, dentre outras despesas de custeio da máquina pública.

Para o presidente em exercício do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital, os indicadores de saúde e as condições de trabalho para os médicos nos municípios revelam como os valores gastos estão abaixo do ideal. “Como podemos ter uma saúde de qualidade para nossos pacientes e melhor infraestrutura de trabalho para os profissionais do setor com tão poucos recursos? O pior de tudo isso é que, enquanto Estados e Municípios se esforçam para aplicar o mínimo previsto em lei, a União deixa de gastar, por dia, R$ 22 milhões que deveriam ser destinados à saúde pública”, criticou o presidente ao relembrar um estudo do CFM, no qual aponta que, entre 2001 e 2012, o Ministério da Saúde deixou de aplicar quase R$ 94 bilhões de seu orçamento previsto.

Além da má qualidade da gestão dos recursos, que tem impacto direto na assistência da população e na atuação dos profissionais, os representantes dos médicos acreditam que a saúde pública no Brasil não é uma prioridade de governo. “Recentemente, um grupo ligado aos planos de saúde mostrou que cada um dos 50,2 milhões de beneficiários de planos privados pagou, em média, R$ 179,10 por mês para contar com a cobertura de seu plano em 2013. Isso representa cerca de R$ 2.150,00 por ano – quase o dobro do que os governos pagam pelo direito à saúde pública”, ponderou o diretor de Comunicação do CFM, Desiré Callegari.

Comparação internacional – As informações do CFM dialogam com dados da Organização Mundial da Saúde – OMS (Estatísticas Sanitárias 2014), que, apesar de diferenças metodológicas, revelou que o Governo brasileiro tem uma participação aquém das suas necessidades e possibilidades no financiamento. Do grupo de países com modelos públicos de atendimento de acesso universal, o Brasil era, em 2011, o que tinha a menor participação do Estado (União, Estados e Municípios) no financiamento da saúde.

Segundo os cálculos da OMS, enquanto no Brasil o gasto público em saúde alcançava US$ 512 por pessoa, na Inglaterra, por exemplo, o investimento público em saúde já era cinco vezes maior: US$ 3.031. Em outros países de sistema universal de saúde, a regra é a mesma. França (US$ 3.813), Alemanha (US$ 3.819), Canadá (US$ 3.982), Espanha (US$ 2.175), Austrália (US$ 4.052) e até a Argentina (US$ 576) aplicam mais que o Brasil.

Ranking dos estados e capitais – O levantamento do CFM, que acaba de ser lançado, considerou ainda os dados declarados pelos maiores municípios de cada um dos dez estados mais populosos do país. A comparação mostra que, embora alguns estados e municípios tenham aplicações maiores que outros, em geral os valores são insuficientes para melhorar indicadores de saúde em nível local. Neste estudo, as despesas em saúde foram cruzadas com Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), oferta de leitos para cada grupo de 800 habitantes, taxas de incidência de tuberculose e dengue, além da cobertura populacional de Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e Equipes de Saúde da Família (ESF).

É o caso, por exemplo, do Distrito Federal, líder do ranking estadual do gasto em saúde, com R$ 1.042,40 por pessoa ao ano. Apesar disso, o DF apresenta o pior desempenho de cobertura populacional de ACS (19%) e de ESF (20%). Por dia, são gastos R$ 2,90 na saúde da população do Distrito Federal, valor que também não foi suficiente para livrá-lo da pior taxa de leitos por habitantes do país: apenas 0,7 leito para cada 800 habitantes.

Em último lugar no ranking, aparece Alagoas, onde foram gastos apenas R$ 204,89, em 2013, na saúde de cada habitante, o equivalente a R$ 0,57 ao dia. Apesar das taxas de incidência de doenças e demais indicadores de saúde local não estarem entre os piores, Alagoas tem o pior IDH do país, segundo pesquisa divulgada pelo Programa das Nações Unidas (PNUD) no ano passado e que mede o desenvolvimento econômico e a qualidade de vida oferecida pela população. Clique aqui para conferir o ranking dos estados.

Entre as capitais, a média do gasto em saúde por pessoa é de R$ 542, 8. Onze cidades figuram abaixo desse valor. Belo Horizonte/MG tem o melhor desempenho relativo, com R$ 933,86 ao ano, seguido pelas cidades de Campo Grande/MS (R$ 919,30) e Teresina/PI (R$ 874,82). Na outra ponta, Rio Branco-AC (R$ 240,53), Boa Vista/RR (R$ 271,19) e Belém/PA (R$ 284,77) aparecem com os piores desempenhos. Em Macapá, capital do Amapá, os gastos em saúde não foram encontrados, nem nos relatórios resumidos de execução orçamentária, nem no portal da transparência da prefeitura, motivo que pelo qual a cidade não foi incluída no levantamento. Clique aqui para conferir o ranking das capitais.

Fonte: CFM

Bioética - Pais que não vacinam estão na contramão da lei e da ciência: atender ao Calendário Básico de Vacinação é obrigatório por lei

A imunização corresponde a uma das maiores conquistas históricas e científicas em saúde pública, contendo, por décadas, doenças responsáveis pela morte de milhares de pessoas no mundo, como varíola, sarampo e poliomielite. No entanto, volta e meia aparecem grupos movidos por confusões e informações equivocadas, que defendem o direito de não vacinar, abrindo as portas para surtos e arriscando suas próprias crianças. São representantes de classes sociais e níveis educacionais elevados, que, por vezes, contam com o incentivo de médicos.

Essa tendência foi verificada há alguns anos, por pesquisa qualitativa financiada pelo próprio MS, que mostrou que capitais, como São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Florianópolis e Recife, apresentaram coberturas menores para algumas vacinas no chamado estrato A, que agrega famílias com melhores condições socioeconômicas e educacionais. O estudo será reavaliado em 2015.

De acordo com o secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (MS), Jarbas Barbosa, “isso só pode ser explicado pela mística de que boas condições de vida impedem doenças infecciosas”, incentivada por rumores de internet, que também exageram efeitos adversos dos imunizantes. Vai mais longe o bioeticista Arthur Caplan, da Universidade de Nova Iorque: como disse ao Jornal do Cremesp, tal decisão vem da “combinação de ignorância, falta de bom senso e de compreensão sobre reais riscos de contrair doenças graves por meio de viagens, creches e trabalhadores não vacinados que acessam suas casas e escolas etc”.

Essas atitudes, somadas à pouca convivência de algumas gerações com infecções graves controladas pelas vacinas – grande contradição – ateiam fagulhas em uma cobertura vacinal abrangente e eficiente, como é a brasileira, que supera 80% em crianças de até 18 meses.

Tendência tímida, mas perigosa
Barbosa lamenta o fato de que uma minoria de pediatras, de outras orientações filosóficas, recomende imu­nização seletiva ou a não vacinação. Reforça, porém, que no Brasil não há um movimento organizado antivacinas, como em certos países.

Na Europa e, em espe­cial, nos Estados Unidos, grupos radicais, como o Vaccine Resistance Movement, conclamam a população a “expor fraudes relativas à vacinação” e a preparar-se para “promover ações judiciais coletivas” direcionadas às agências de saúde que apre­goam imunização coletiva. Resultado: surtos, co­mo o de coqueluche que, no ano passado, atingiu mais de 24 mil norte-americanos vulneráveis.

“Felizmente esse modismo tem pouco impacto por aqui, e se resume a segmentos populacionais difíceis de ser atingidos pelas campanhas”, opina Gabriel Oselka, presidente da Comissão Permanente de Assessoramento em Imunizações da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo. “Seguramente, a cobertura um pouco menor nas classes A e B se dá por colegas que, movidos quase sempre por questões filosóficas, não prescrevem imunizantes“. Aqui se podem incluir visões filosóficas (e mesmo científicas) de alguns representantes da homeopatia e da antroposofia – que não refletem necessariamente a posição oficial de suas principais entidades profissionais, que reconhecem os benefícios concretos das vacinas, mas, eventualmente, recomendam contraindicar a imunização a um determinado paciente, em um momento particular.

Problemas éticos e legais
Entre os brasileiros, atender ao Calendário Básico de Vacinação, do Programa Nacional de Imunizações (PNI), é obrigatório por lei, constando do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). É óbvio que o médico também deve respeitar a norma, já que o artigo14 do Código de Ética Médica o proíbe de “praticar ou indicar atos médicos desnecessários ou proibidos pela legislação vigente no País”.

Em termos de saúde pública, é preciso considerar o uso generalizado da imunização para a efetividade final. Pensar no coletivo adquire importância ética essencial. Para Barbosa, “crianças bem-nutridas, que vivem em condomínios de luxo, podem até desenvolver, por exemplo, uma forma mais leve de sarampo. O problema é a possibilidade de transmitir aos filhos dos porteiros e das faxineiras, e a outros com doenças congênitas”.




Processar ou não. Eis a questão.
O bioeticista Arthur Caplan, da Universidade de Nova Iorque, líder do grupo que defendeu a punição a pais que não vacinam, em artigo publicado no Journal of Law, Medicine & Ethics, cogita resolver a questão de maneira radical: “Você pode escolher vacinar ou não seu filho. Só que se essa decisão causar danos ou provocar a morte de alguém, você pode ser processado”.
Para ele, ao requerer seu direito de não vacinar, os pais deveriam ser obrigados a explicar por escrito seus motivos, assumindo a responsabilidade por qualquer dano que recair sobre alguém. Inclusive o de pagar do próprio bolso o custo do tratamento de doença prevenível com vacina.

Texto originalmente publicado no Jornal do Cremesp nº 316/julho de 2014