Colega
diretor de hospital de pequeno porte apresenta várias dúvidas em
relação à admissão de pacientes Testemunhas de Jeová – que se recusam a
receber transfusão de sangue – em cirurgias eletivas.
Ressalte-se
que as respostas, sugeridas pela Câmara Técnica Interdisciplinar de
Bioética do Cremesp não se direcionam a crianças sob responsabilidade
legal de Testemunhas de Jeová. Vale também lembrar que o exercício do
consentimento informado e os princípios expostos aqui são aplicáveis a
qualquer paciente que deseja exercer suas opções terapêuticas,
independentemente da motivação.
Sobre
o primeiro questionamento: em casos de cirurgias eletivas em pacientes
Testemunhas de Jeová em hospitais de pequeno porte, envolvendo pacientes
estáveis, não há infração ética na admissão pura e simples desses
atendidos, ainda que se considere a situação de instituições que não
dispuserem de procedimentos terapêuticos alternativos às transfusões.
Ou seja, o atendimento ou internação em si não se constituiriam em
imprudência, negligência e/ou imperícia.
Inclusive,
há o entendimento de que um hospital não pode recusar a internação de
um paciente pelo fato de o mesmo recusar transfusões como recurso
terapêutico, uma vez acordado com a equipe médica, pois isso pode ser
caracterizado, inclusive, como omissão.
A
eventual recusa deve ser anotada em documentos como Termo de
Internação(TI); Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ou
Termo de Consentimento Informado (TCI); sendo essa uma garantia jurídica
para o paciente, médico e o hospital.
Uma
vez admitido, a instituição, em parceria com a equipe médica, devem
diligenciar em busca do melhor atendimento para o paciente, o que pode
incluir a obtenção de segunda opinião médica, transferência entre
equipes e até mesmo transferência para outra instituição – na hipótese
de não ser possível assisti-lo.
Em
relação ao uso de técnicas cirúrgicas que evitem transfusões de sangue,
é recomendável que tanto cirurgião e anestesiologista estejam de acordo
quanto à estratégia. Neste sentido, ainda que haja discordância, não há
como separar a responsabilidade de ambos perante eventuais problemas,
pois o paciente é um só e deve ser o alvo da atenção dos dois.
No
caso de o paciente maior, lúcido (a), orientado(a) e autônomo(a)
aceitar a proposta terapêutica apresentada pelo médico – inclusive,
sobre transfusão – a decisão deve ser registrada de forma a salvaguardar
a atuação profissional, mas também ser mantida no mais absoluto sigilo.
Para isso, o diálogo sobre as opções terapêuticas deve acontecer única e
exclusivamente com o(a) paciente em local reservado e sem a presença ou
acesso de outras pessoas, também para minimizar a possibilidade de
coação externa.
No
caso de o (a) paciente manter a não aceitação da proposta terapêutica
pela transfusão, deve-se acatar sua autonomia de decisão, que deve ser
documentada, cabendo ao médico esgotar todas as opções e recursos
terapêuticos para controle de sangramento e equilíbrio hemodinâmico
antes que a transfusão seja utilizada.
Independente
do pactuado, permanece válido o artigo do Código de Ética Médica que
preconiza a transfusão “em caso de risco de morte”.